Reflexões sobre o Atendimento Ginecológico
Hoje me deparei com um vídeo que retrata, de forma cômica, o chamado "médico tóxico", um tema que tem ganhado espaço na internet. Achei a abordagem genial, especialmente porque reflete uma realidade cada vez mais comum: a de médicos que, por diversos motivos, acabam se tornando menos atenciosos, impacientes e, em alguns casos, desumanos. Essa é uma queixa que tenho ouvido com frequência no meu consultório, tanto de pacientes quanto em relatos de colegas.
Como ginecologista, entendo que a consulta ginecológica carrega um peso emocional e psicológico significativo para as pacientes. É um momento que envolve exposição física e, muitas vezes, emocional. Por isso, é doloroso ouvir relatos como "o médico não me examinou", "ele foi grosseiro" ou "a médica me machucou". É inconcebível que uma paciente saia de uma consulta com essa impressão.
No entanto, o que mais me chamou a atenção no vídeo — e que também tenho observado no meu dia a dia — é o espanto de algumas pacientes quando informo que vou examiná-las. É real: muitas se surpreendem quando peço permissão para examinar um corrimento ou quando sugiro um exame preventivo completo durante uma consulta de rotina. Recentemente, atendi uma paciente que me disse: "Dra., tenho 44 anos e é a primeira vez que examinam minhas mamas". Outra, com corrimento de repetição, relatou: "Nunca pediram para olhar, só me passam pomada e me liberam".
Esses relatos são preocupantes. Aos colegas que agem dessa forma, é importante lembrar que a negligência no exame físico não só compromete a qualidade do atendimento, mas também pode levar a diagnósticos tardios ou incorretos. Desde os primeiros anos da faculdade de medicina, aprendemos que o exame físico tem um potencial diagnóstico que pode chegar a 80% de acurácia. Ignorar essa ferramenta é, no mínimo, irresponsável.
Também é preciso refletir sobre os sistemas de saúde e as instituições que, em muitos casos, impõem metas completamente distantes da realidade, que não favorecem um atendimento adequado. Há lugares onde o médico dispõe de apenas 10 minutos para realizar uma consulta. Como isso é possível? Especialmente na ginecologia, onde os procedimentos exigem tempo e cuidado, e as pacientes precisam de um ambiente seguro para se despir e se sentir confortáveis. Apesar das reclamações, o sistema parece não mudar.
Diante disso, fica a reflexão: não podemos nos deixar vencer pelo cansaço, pela pressão por metas inalcançáveis ou pela falta de recursos. Precisamos buscar, diariamente, aprimorar nossa atuação, mantendo o compromisso com a ética, a humanização e a qualidade do cuidado. Não podemos permitir que a negligência, a imperícia ou a imprudência se tornem parte da nossa prática.
Que possamos, sempre, honrar o juramento que fizemos à medicina, colocando o bem-estar e a dignidade dos pacientes no centro do nosso trabalho.